Práticas de avaliação e monitoramento facilitam tomada de decisão em redes públicas
Um termômetro não acaba com a febre, mas ele é um instrumento importante para o médico decidir quais ações tomar. O mesmo vale para os administradores de uma rede de educação: contar com bons instrumentos de diagnóstico, de avaliação e de monitoramento é fundamental para uma boa gestão.
Os modelos adotados em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, e em Rio Branco, capital do Acre, renderam o Prêmio “Gestão Inovadora na Educação” para as duas secretarias de Educação. Iniciativa da Mind Lab, metodologia de ensino que adota jogos de raciocínio para desenvolver habilidades cognitivas e socioemocionais em crianças e jovens, a ação tem apoio técnico do Porvir. O prêmio reconhece e valoriza gestões municipais que se destacam pela inovação e efetividade na área da educação.
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Em Angra dos Reis, graças a uma parceria com o Caed (Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação), a cidade passou a aplicar bimestralmente avaliações padronizadas para guiar o trabalho de gestão e dos docentes.
“A gente tem a cada bimestre um Ideb (em referência ao Índice de Desenvolvimento de Educação Básica), com resultados quase imediatos, o que favorece a tomada de decisão”, afirma o secretário de Educação do município, Paulo Fortunato de Abreu. Segundo ele, a prova padronizada não dispensa as avaliações que os professores fazem em classe, mas servem como uma forma extra de monitorar os avanços dos alunos. E tampouco fica exaustivo para os estudantes. “É algo processual, então elas vão se habituando. Já entrou na rotina”, garante.
Atualmente, até a fluência leitora é medida. Em um tablet, as crianças escolhem seus livros e gravam suas leituras. Os áudios depois são sincronizados e enviados ao Caed para o diagnóstico: são leituras de quase 8 mil crianças. “Eles nos devolvem dizendo em que estágio de leitura esse aluno está. No caso das turmas do segundo ano, é o que nos dá o norte da alfabetização, porque a gente sabe que a leitura é peça fundamental desse processo”, explica Paulo.
A rede abraçou não apenas o sistema local, chamado de Idear, como também passou a se engajar mais no sistema nacional, o Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica). Na última edição do Saeb, 100% das escolas elegíveis obtiveram o percentual de estudantes necessários para a divulgação de seus resultados. Em 2019/2020, somente 67% das unidades tiveram seus resultados divulgados, porque os estudantes simplesmente faltavam no dia da prova.
Para criar uma cultura avaliativa entre alunos e professores, foi preciso vencer algumas resistências, reconhece o secretário. Ele, no entanto, faz questão de elogiar a receptividade geral. “A rede reagiu melhor do que eu esperava. No fundo, todo mundo sabe que é importante. A educação precisa de evidências”, afirma Paulo. Outro ponto que ajudou na adesão foi a forma de comunicá-la: trata-se de uma avaliação de todo o processo de ensino-aprendizagem, e não uma avaliação de qualidade de determinado docente ou de certo aluno.
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Por ser professor concursado da rede estadual, com muitos anos de experiência em sala de aula, Paulo sabe que a maior fonte de resistência dos professores acontece na verdade por não se sentirem apoiados. Portanto, implantar um sistema de monitoramento tem de caminhar de mãos dadas com outras medidas mais estruturais. “Se a escola está toda quebrada, se está sem merendeira, se falta funcionário de apoio, como querem avaliar o aprendizado? Para fazer qualquer avaliação, primeiro o professor tem que ter as condições para focar no pedagógico”, diz.
Não é à toa que a criação do sistema de avaliação é apenas uma das inovações recentes da educação em Angra dos Reis. A rede tem experimentado novidades tecnológicas, como é o caso da distribuição de notebooks com conectividade para o corpo docente, e de tablets com conectividade para os estudantes. E também há mais boas notícias nas atividades extracurriculares, com novas aulas-passeio. No ano passado, todos os estudantes foram à Bienal do Livro do Rio de Janeiro, com direito a um voucher para comprarem livros. “Foi emocionante. Alguns alunos nunca tinham saído de onde moram”, relata o secretário.
Trabalho consolidado
Quando a meta de melhorar é mesmo levada a sério, é importante que os resultados das avaliações sejam ferramentas não apenas do professor no dia a dia da sala de aula, mas também para a gestão. Quem afirma é Zélia Mendonça, diretora de ensino de Rio Branco, capital do Acre. “O programa de avaliação da aprendizagem já é um trabalho consolidado na nossa rede. A partir dos dados, a gente vai direcionando o acompanhamento e a formação continuada dos professores”, conta.
Nem sempre é fácil testar todos os públicos. Por isso, o monitoramento não se restringe aos resultados em testes padronizados, passando também por conversas, retornos avaliativos, relatórios e análises de dados gerais. “Nossa gestão investiu bastante em aquisição de equipamentos, o que é um avanço para o processo de ensino e aprendizagem, mas notamos que as tecnologias não estavam sendo tão usadas como a gente esperava. Assim, nesse último ano, passamos a investir na formação de professores e temos uma equipe de tecnologia para acompanhar o uso e dar suporte”, explica Zélia.
Um dos maiores desafios na rede é acompanhar o desenvolvimentos das crianças, para que nem elas fiquem de fora do processo. “Na educação infantil não há uma avaliação por instrumentos, mas as professoras constroem relatórios mensais, que vão ser analisados e servir de base para novas intervenções. É um trabalho minucioso”, diz a diretora. E a própria rede já sente resultados positivos. “Temos o cuidado de oferecer qualidade também para a educação infantil. E percebemos que as crianças atendidas têm um desempenho muito melhor no ensino fundamental”, conclui.